habito este mundo
como quem foi esquecida
num vão entre pulsações
presente demais pra morrer,
ausente demais pra viver.
sou o corpo que anda,
mas a alma ficou pra trás.
carrego no peito uma ausência tão densa
que engasga até o silêncio.
respiro porque o corpo insiste,
não porque quero.
acordo porque o relógio grita,
não porque há algo que me espere.
ninguém nota
mas estou desmoronando
em plena luz do dia,
como quem sorri pra não assustar os outros
com a verdade do abismo.
meus olhos mentem esperança,
meus pés fingem direção.
mas cada passo é um arrasto,
cada segundo, um naufrágio.
o ontem me sangrou,
o amanhã me nega.
sou só o entre
um eco perdido no vão dos dias.
dizem que é só uma fase.
mal sabem que já fui tantas fases
que me perdi no zodíaco da dor.
a sombra que me segue
anda mais ereta do que eu.
ela ainda sabe pra onde vai.
eu?
eu só vou.
e no fundo, bem no fundo
grito.
não com a boca.
mas com tudo que ainda restou de mim
depois que o mundo parou de ouvir.