Me disseram que o tempo cura,
mas ele só fez calar a dor no canto.
Ficou ali, costurando minha sombra
com os fios daquilo que me quebrou.
Eu jurei nunca ser como ela,
como ele, como aqueles.
Mas hoje me vejo
com os mesmos gestos,
o mesmo tom de voz,
e essa raiva escondida
que me consome sem avisar.
Quantas vezes repeti
as frases que me fizeram sangrar?
Quantas vezes machuquei
tentando me defender?
Eu não quero ser o reflexo da dor,
nem o eco de uma infância engasgada,
nem a continuação de um ciclo podre
que insiste em viver pela minha boca.
Hoje, me olho no espelho
e imploro com os olhos cansados:
me salva de mim,
antes que eu me torne exatamente
aquilo que lutei pra sobreviver.
habito este mundo
como quem foi esquecida
num vão entre pulsações
presente demais pra morrer,
ausente demais pra viver.
sou o corpo que anda,
mas a alma ficou pra trás.
carrego no peito uma ausência tão densa
que engasga até o silêncio.
respiro porque o corpo insiste,
não porque quero.
acordo porque o relógio grita,
não porque há algo que me espere.
ninguém nota
mas estou desmoronando
em plena luz do dia,
como quem sorri pra não assustar os outros
com a verdade do abismo.
meus olhos mentem esperança,
meus pés fingem direção.
mas cada passo é um arrasto,
cada segundo, um naufrágio.
o ontem me sangrou,
o amanhã me nega.
sou só o entre
um eco perdido no vão dos dias.
dizem que é só uma fase.
mal sabem que já fui tantas fases
que me perdi no zodíaco da dor.
a sombra que me segue
anda mais ereta do que eu.
ela ainda sabe pra onde vai.
eu?
eu só vou.
e no fundo, bem no fundo
grito.
não com a boca.
mas com tudo que ainda restou de mim
depois que o mundo parou de ouvir.
Ultimamente, minha mente tem sido um lugar tumultuado.
As ideias que antes pareciam sólidas estão se desfazendo devagar, como tinta escorrendo pela chuva. Estou reconstruindo tudo minhas opiniões, minha forma de ver o mundo, meu lugar nele.
É estranho e, ao mesmo tempo, necessário. Um processo silencioso, mas gritante por dentro.
No meio desse caos de pensamentos, há uma única certeza que permanece imóvel, inabalável: a morte.
Ela não espera a gente estar pronto.
Ela não pede permissão, não manda aviso, não liga se estávamos bem ou não.
E o mais curioso é como essa certeza, apesar de tão definitiva, costuma ser esquecida ou evitada, como se não fosse real até bater à porta.
Talvez por isso eu tenha parado hoje para escrever.
Não porque estou triste ou com medo, mas porque percebi que há uma liberdade estranha nessa certeza.
Saber que vou morrer muda a forma como olho para o tempo.
De repente, os dias ganham um peso diferente mesmo os mais vazios.
Mesmo os em que nada faz sentido.
A vida não gira em torno de mim.
E isso, ao invés de me doer, me alivia.
O mundo não precisa me esperar. As estações não vão parar se eu não estiver.
E tudo bem. Porque há beleza em continuar mesmo depois que a gente vai.
Há paz em saber que nem tudo precisa depender de mim.
E se, no meio dessa confusão interna, tudo o que me resta for essa única certeza… que ela, pelo menos, me ensine a estar presente.
Mesmo que eu não entenda tudo.
Mesmo que eu ainda me sinta perdida.
— Camila Barbosa
Hoje eu consegui pensar um pouquinho no futuro.
É estranho escrever isso parece simples, mas faz tanto tempo que ele estava bloqueado na minha memória. Como se o amanhã fosse uma estrada em neblina, e eu estivesse parada, com medo de dar qualquer passo.
Mas hoje, algo em mim se abriu. Talvez tenha sido o céu mais claro, ou o café que aqueceu meu peito de um jeito diferente. Talvez tenha sido só o fato de eu ter me escutado com mais gentileza.
A verdade é que, por alguns minutos, consegui imaginar possibilidades. Não certezas, não grandes planos só a ideia de que existe algo depois desse agora.
Pensei em lugares que ainda quero conhecer, em risadas que ainda quero dar, em pessoas que talvez ainda nem conheci e já me aguardam em algum cruzar de caminhos. Pensei na casa que quero morar, no cheiro do bolo que vou assar num domingo qualquer, na música que vou colocar pra tocar só pra dançar sozinha pela sala.
Pensei até em como eu quero amar: leve, sem medo, com entrega, mas com raiz.
Pensar no futuro não significa ter tudo resolvido. Significa apenas acreditar que ainda há tempo, espaço e sentido. Que a estrada, mesmo torta, leva pra algum lugar bonito.
E quer saber? Mesmo que ainda doa às vezes, mesmo que algumas feridas ainda estejam aqui, latejando... hoje eu senti algo diferente: vontade.
Vontade de viver o que ainda não vivi.
Vontade de me descobrir mais um pouco.
Vontade de continuar.
Mas aí...
Eu acordei.
Era só um sonho.
A cama seguia vazia, o céu estava cinza, e o café nem teve gosto. O futuro voltou a ser um borrão. E eu, mais uma vez, fiquei presa nesse presente doído, tentando respirar entre o desânimo e a realidade.
A esperança escorregou pelos dedos, como sempre.
Hoje, o dia foi péssimo. E, sinceramente? Eu estou de novo desesperançosa.
Mas escrevi. E talvez, só talvez, isso já signifique alguma coisa.
Tem dias que a minha alma pesa mais que meu corpo.
É como se eu caminhasse dentro de um rio escuro, tentando respirar debaixo da própria tristeza.
A depressão não grita, ela sussurra devagar...
E me convence, com voz mansa, de que eu não sirvo, que não basta, que não tem saída.
Mas eu continuo. Mesmo quando não acredito.
Mesmo quando levantar da cama parece uma batalha perdida antes de começar.
Carrego comigo dores antigas da infância que me deixou órfã em vida,
do luto silencioso de quem perdeu muito cedo o único colo que amava de verdade.
A solidão virou minha companhia mais fiel.
Ela não falta. Ela sabe meu nome. Dorme comigo, me acorda de madrugada,
me pergunta coisas que doem:
"Por que você ainda está aqui?"
"Quem te ama de verdade?"
"Você já se olhou hoje?"
E às vezes eu respondo.
Mas às vezes só choro, quieta, como quem quebra por dentro e ninguém escuta.
Não escrevo isso pra comover, nem pra consolar ninguém.
Escrevo porque é o que me mantém viva.
Porque transformar a dor em palavra é a única forma que encontrei de não deixar que ela me engula.
Se você também sente esse buraco no peito, essa exaustão sem nome,
senta aqui comigo.
A gente não precisa dizer nada. Só existir, lado a lado, em silêncio e verso.
Eu sou Camila Barbosa, e carrego monstros dentro de mim.
Mas hoje, eu os escrevo.
E escrever... é a forma mais bonita que encontrei de não desistir.